A recente decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que afastou a condenação de uma empresa do setor de engenharia ao pagamento do adicional de confinamento a um trabalhador terceirizado, foi recebida com destaque por especialistas em direito trabalhista, sobretudo por sua repercussão no cenário das contratações em setores estratégicos. O adicional, previsto em norma coletiva dos empregados da Petrobras, estabelece uma remuneração extra para aqueles que atuam em locais isolados ou de difícil acesso, como plataformas offshore. Contudo, o autor da ação era funcionário de uma empresa prestadora de serviços e, portanto, não abrangido pela convenção coletiva da estatal. A decisão da Quarta Turma do TST foi unânime e reforçou os limites da legislação quanto à aplicabilidade de normas coletivas, consolidando um precedente importante sobre a separação entre categorias profissionais no contexto das terceirizações.
Para o advogado Carlos Alexandre Moreira Weiss, da Weiss Advocacia, a importância da decisão vai além do caso concreto e atinge diretamente o setor empresarial como um todo. “A decisão tem grande relevância para o setor empresarial, pois reafirma que empresas contratadas, ainda que atuem em áreas sensíveis ou em condições especiais, não estão obrigadas a conceder benefícios previstos em acordos coletivos firmados pela tomadora de serviços, salvo previsão contratual ou legal”, avalia. Segundo ele, isso reforça a segurança jurídica para contratos em áreas como a engenharia, onde há atuação conjunta de trabalhadores com diferentes vínculos e níveis de especialização.
No caso julgado, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) havia acolhido o pedido do trabalhador com base no princípio da isonomia, entendendo que ele fazia jus aos mesmos benefícios dos empregados da Petrobras por exercer atividades em condições semelhantes. Entretanto, a defesa da empresa recorreu ao TST, sustentando que não havia amparo legal ou contratual para o pagamento do adicional de confinamento. “O argumento principal foi a violação ao Princípio da Legalidade, previsto no artigo 5º, II da Constituição, já que a empresa não participou da negociação coletiva nem era representada pelo sindicato da tomadora”, explica Weiss. O TST acolheu essa tese, enfatizando que a isonomia não pode ser aplicada de forma a criar obrigações sem base normativa, destacando que o TRT decidiu “em contrariedade com a jurisprudência uniforme e pacificada do TST”.
Weiss considera o julgamento um marco relevante na delimitação dos efeitos das normas coletivas sobre trabalhadores terceirizados. “O TST fixou que a mera similitude de funções ou condições de trabalho não autoriza a extensão automática de direitos de convenções coletivas de outra categoria, o que tende a influenciar julgamentos semelhantes, sobretudo em setores com terceirização ampla e complexa e para a atuação preventiva das empresas”, afirma. Para ele, trata-se de um reforço à liberdade negocial e ao respeito aos limites da representatividade sindical, pilares do sistema trabalhista brasileiro.
Questionado sobre os riscos jurídicos da extensão de benefícios a trabalhadores terceirizados sem respaldo contratual ou legal, Weiss é enfático: “Essa prática pode resultar em condenações imprevisíveis e comprometer o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, pois a empresa prestadora não detém controle sobre as cláusulas pactuadas entre a tomadora e o sindicato”. Ele ressalta ainda que tal imposição contraria os princípios da livre iniciativa e da negociação coletiva, ao atribuir obrigações a partes alheias ao acordo.
A decisão, segundo o advogado, tem potencial para se tornar referência em casos semelhantes e tende a inibir novas ações com o mesmo perfil, ao estabelecer com clareza os contornos da responsabilidade das prestadoras de serviços. “O TST reforçou que a existência de condições semelhantes não é suficiente para justificar a extensão dos benefícios previstos em norma coletiva, prestigiando o princípio da Legalidade e a Segurança Jurídica”, pontua Weiss.
Nos últimos anos, a jurisprudência do TST tem se consolidado em favor da autonomia dos instrumentos coletivos, restringindo sua aplicação aos trabalhadores representados pelas entidades sindicais signatárias. A decisão da Quarta Turma segue esse entendimento, alinhando-se a outros precedentes da Corte. Weiss lembra que, embora haja decisões pontuais em sentido contrário, “o TST, especialmente por meio da SDI-1, tem reafirmado o respeito à representatividade sindical e à legalidade como limites à aplicação de cláusulas normativas, dando efetividade ao seu papel de pacificador jurisprudencial”.
Além de garantir previsibilidade nas relações de trabalho, a decisão fortalece a segurança jurídica nas contratações, segundo Weiss. “Ao valorizar a autonomia das partes envolvidas na negociação coletiva e impedir a imposição de obrigações a terceiros alheios ao processo negocial, a decisão contribui para o fortalecimento da segurança jurídica, pois garante previsibilidade e respeita os limites da atuação dos sindicatos”, analisa.
Para as empresas, o especialista recomenda cuidados redobrados ao firmar contratos com prestadoras de serviço que atuem em ambientes específicos, como locais de confinamento. “É essencial definir com clareza as cláusulas contratuais, especialmente as que tratam de segurança e saúde no trabalho, além de fiscalizar o cumprimento dos direitos mínimos legais”, sugere. Também é importante documentar a autonomia da terceirizada na gestão de pessoas e assegurar que os contratos indiquem expressamente a não vinculação às normas coletivas de categorias distintas.
Encerrando sua análise, Weiss destaca a principal lição trazida pela decisão: “A necessidade de respeitar os limites da representatividade sindical e da legalidade. As relações devem ser estruturadas com contratos claros e disposições específicas, deixando evidente que os acordos coletivos firmados não se estendem automaticamente a categorias não envolvidas na negociação. Trata-se de um alerta para reforçar a segurança jurídica e evitar distorções na aplicação das normas coletivas”, finaliza.
Crédito Imagem: André Motta Souza