Segundo o artigo 125 da Lei de Propriedade Industrial, será assegurada à marca registrada no Brasil considerada de alto renome a proteção especial em todos os ramos de atividade.
Não há como inferir o sentido de proteção especial previsto para a marca de alto renome sem vinculá-lo ao princípio da especialidade, o qual, por sua vez, não pode ser entendido fora do sentido de concorrência.
Convém, portanto, breve explicação de cada um desses pontos.
A concorrência ocorre quando resta configurada a confusão pelo consumidor frente às marcas, idênticas ou não, de diferentes produtos ou serviços. Em outras palavras, é o consumidor adquirindo um produto ou serviço de terceiro pensando, equivocadamente, que este pertence ao titular de determinada marca.
Já o princípio da especialidade é a exclusividade no uso de um signo dentro de um específico segmento ou atividade, os quais são categorizados internacionalmente via Classificação Internacional de Produtos e Serviços. Esta classificação foi adotada pelo Brasil em 3 de janeiro de 2000.
O princípio da especialidade está previsto no inciso I do artigo 123 da Lei de Propriedade Industrial, que estabelece que marca de produto ou serviço é o signo usado para distinguir aquele produto ou serviço de outro idêntico, semelhante ou afim, de origem diversa.
A concorrência anuncia a necessidade do princípio da especialidade como pilar do Direito Marcário, na medida em que aquela delimita a identidade, semelhança e/ou afinidade de marcas de produtos ou serviços cujas origens sejam distintas.
Contudo, em razão do aprimoramento e da complexidade das relações comerciais e humanas, verificou-se a necessidade de se criar uma exceção ao princípio da especialidade, privilégio este que transita também pela concorrência. Essa exceção é o reconhecimento de alto renome a uma marca, a qual passa a gozar de proteção especial em todos os segmentos e ramos de atividade ainda que atue somente em um ou alguns destes.
De acordo com a Resolução INPI/PR nº 107/2013, alterada pela Resolução INPI/PR nº 172/2016, a comprovação do alto renome se dá por meio da presença concomitante de três elementos, sendo eles: I) reconhecimento da marca por ampla parcela do público em geral; II) qualidade, reputação e prestígio que o público brasileiro em geral associa à marca e aos produtos ou serviços por ela assinalados; e III) grau de distintividade e exclusividade do sinal marcário.
A comprovação da presença desses três elementos é, usualmente, feita por meio de pesquisa de mercado a ser realizada por empresa idônea, específica para atendimento desses fins e que obedecem a determinados requisitos.
A pesquisa acabará por revelar — e isso nos parece ser um aspecto de extrema importância — que a aclamação do público àquela marca também está presente naquele consumidor que nunca adquiriu tal produto ou serviço, mas que reconhece sua qualidade, reputação e prestígio.
Depreende-se, assim, que os elementos necessários para o reconhecimento como alto renome são, em outras palavras, a própria constatação do árduo trabalho do titular da marca na obtenção e manutenção de estima de seu público que, como resultado, fez com que sua marca e/ou sua atuação exorbitasse os limites de um segmento ou atividades específicos.
Isto porque a eficácia daquele signo é tal que seu uso, feito por terceiro e associado a um produto ou serviço não originário do segmento ou atividade em que seu titular atua, poderá gerar confusão pelo público — evidenciando a concorrência — e, por isso, cabível sua proteção especial em todas as classes, como exceção ao princípio da especialidade.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 17 de setembro de 2020, 15h09
Juliana Cristina Ramos Costa é advogada da área de propriedade intelectual e contratos do escritório Weiss Advocacia.